quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Vida de milionária na Suíça


Como já havia comentado por aqui, eu às vezes me surpreendo com minha capacidade de viver situações insólitas. Eu agora, no caso, estou tendo a capacidade de viver uma vida de milionária mesmo sem um tostão no bolso. A casa onde estou parando aqui em Thun, é de duas grandes amigas, que acabei conhecendo em Paris, quando fazia a escola de teatro do Philippe Gaulier. Na real aqui, é uma pousada também. Tudo é perfeito, impecável, exatamente aos moldes suíços. Parece um mundo de contos de fadas. Todas as casinhas são cheias de enfeites, detalhes coloridos, flores nas janelas. No Brasil poderíamos utilizar a expressão “frufru”.
A casa onde estou tem sacada para os Alpes e cama de massagem automática. Assim, tomo meu café da manhã contemplando a gigantesca JungFrau , montanha marrom e  verde com cobertura de “côco”. Quando falo que tomo café da manhã, estou falando  que como O  MELHOR pão, o MELHOR café, a MELHOR manteiga, o MELHOR queijo... tudo aqui é do BOM E DO MELHOR, incluindo todos os itens de cama, mesa e banho. Assim, tenho o MELHOR colchão, o MELHOR travesseiro, a MELHOR coberta...
Continuando minha jornada rica e bucólica, depois do café, ou em qualquer outro momento do dia, recebo essa incrível massagem da cama automática, que faz uso de pedras quentes. Há, e começo meu dia apanhando as pequeninas maçazinhas, e as framboesas que estão disponíveis no jardim.
Preciso contar também de minha chegada “triunfante” na cidade. É incrível, mas eu tenho conseguido a façanha de, sem planejar, estar presente ou mesmo de chegar às cidades no dia do aniversário das mesmas, ou quando estão comemorando algo. Assim aconteceu em Olinda e Recife, onde participei das comemorações de aniversário dessas cidades, assistindo ao show gratuito da Elba Ramalho. Um dia depois que cheguei em Udine,  (Itália), era aniversário da cidade e assim tiveram muitos shows de comemoração, espalhados pelos lugares. Em Veneza nem se fala, cheguei no dia da festa mais importante da cidade a “Festa del Redentore”. Portanto, aqui na suíça não foi diferente, cheguei no dia do aniversário do país. Assim, naquela noite, além de ver pela sacada de casa, as montanhas e Alpes suíços, eu ainda via, uma imensa lua cheia e os fogos de artifício completando o quadro surrealista. Minhas amigas suíças, devido a esses acontecimentos, me denominaram “party girl”.
Nessa comemoração suíça havia algo muito peculiar, ou pelo menos diferente da nossa cultura. TODAS as casas da vizinhança estavam soltando fogos de artifício, e os soltariam pela noite inteira. Mas não se ouvia uma voz humana sequer. No meu entendimento se eles compraram fogos para soltar a noite inteira pelo país, isso significa que realmente amam o lugar onde vivem e queriam festejar. Desta forma eu esperaria ouvir um “eeeee!!” ou “viva a suíça!!” (em Suíço Alemão, é claro), mas o silencio era sepulcral! Aliás, tudo é muito silencioso aqui... Entrei umas três vezes em lojas ou mercado e achei que não houvesse ninguém, devido ao silêncio, mas todos estavam ali... mesma coisa depois que “cai o dia”, não se ouve mais nada, absolutamente nada...e portanto também não se pode fazer barulho nenhum.
Dois dias depois da minha chegada, fui assistir a apresentação de um musical sobre o Titanic. O musical era ao ar livre, e o fundo do “palco” dava para os Alpes e para o Lago de Thun. Essa é a visão mais incrível que eu já pude obter de um lugar. Eu estive em Thun pela primeira vez em 2003 e nunca me esqueço do impacto que tive ao ver essa estupenda paisagem que havia se descortinado aos meus olhos ao estacionar minha bicicleta numa estreita ponte de madeira. Eu nem sequer pude exprimir uma palavra de admiração, fiquei muda por um bom tempo enquanto chorava de beleza. Uma emoção ímpar tomou conta de mim. Coincidentemente conheci uma pessoa em Porto Alegre que assim como eu, pela primeira e única vez na vida (até então)  , havia chorado ao ver uma paisagem e este lugar era uma cidade da Suíça, da qual ela não lembrava mais o nome. Acabamos por reconhecer que se tratava do mesmo lugar quando contei da minha experiência na cidade de THUN.
Trata-se de um imenso lago cor “verde-água nunca dantes visto”, rodeado por majestosas montanhas que exibem variadas formas, contornos, volumes e cores, que vão do verde intenso ao branco neve da base ao topo respectivamente. Há também algumas pedras na encosta - só para combinar dar aquele um toque decorativo característico da cidade.
Na época eu até havia tirado uma foto daquele local, que ficou marcado pra sempre na minha memória. Não é que saindo pra passear a uns dois dias atrás acabo por descobrir que estou há duas quadras daquele lugar? Nem pude acreditar, estou no lugar mais lindo do mundo! E vou poder usufruir dele por mais de um mês!
Na verdade tenho que admitir que, pra mim, às vezes não é tão simples assim aceitar essas condições... quero dizer que às vezes sinto culpa, ou não me sinto merecedora. Na verdade eu tenho que trabalhar profundamente dentro de mim para aceitar a beleza e o bem-estar supremo, quando ele aparece. Não sei por que isso acontece, não sei se é uma coisa minha, ou se é com todo mundo...
Fico pensando se não seria uma herança católica que esta incutida lá no nosso DNA, e que nos faz acreditar que só com muito trabalho ou sofrimento podemos alcançar a felicidade. Ou que devemos fazer MUITO por merecer... Eu costumo me pegar pensando: “tem gente que merece muito mais e não tem nada disso” Por exemplo, tem pessoas realmente lutando pelos direitos humanos, vivendo uma vida de dedicação pela humanidade, de abnegação, e estão muitas vezes vivendo em terríveis condições e perseguições de todos os tipos. Enfim, só dando uma rápida escapada para um papo meio filosófico sobre justiça, religião, sentido da vida, sei lá o que...
Mas voltando finalmente àquela apresentação do Titanic que fui assistir; eu já me daria por satisfeita só por ver aquele “cenário”, nem precisava de mais nada. Mas a encenação começara e assim iam aparecendo os atores vestidos conforme aquela época e invadindo o palco com os carros antigos e com  cânticos em Suíço Alemão! Mais um episódio surrealista para a minha coleção... A peça se desenrolava até chegar o ponto do início do naufrágio, e com ele veio a chuva. Era chuva de verdade... e quanto mais o “barco” afundava na cena, mais a chuva engrossava, o que dava um toque bastante realista a encenação.
Mas como tudo aqui na Suíça é perfeito, o público já estava preparado para as intempéries. Cada um recebeu ao entrar no espaço da encenação, uma capa de chuva. Assim, ao sinal das primeiras gotas, eu vi toda a platéia de “uniforme” amarelo. A chuva foi ficando tão forte que tiveram que cancelar a apresentação, pois estava ficando impraticável para os atores seguirem a cena do náufrago no meio de tanta água! Na saída, era impossível distinguir uma pessoa da outra naquela multidão de capinhas amarelas, assim tivemos que andar, eu e minha amiga, segurando uma na outra até chegar em casa. Não costumo ter medo de me perder nos lugares, quando estou em viagem, pois me sinto confortável com o inglês. Mas aqui é diferente, eu sou literalmente uma surda-muda e analfabeta. É muito estranho e muitas vezes desagradável a sensação de não entender absolutamente nada da língua. Percebo que nem todos falam inglês aqui... Eu estou na parte Alemã da Suíça, portanto eles falam suíço-alemão. Nem o nome da rua onde eu estou eu consigo dizer... mas de qualquer forma eu simpatizo com a língua, não é seca como o alemão, é cantada e redondinha...
Mas por incrível que pareça, apesar destas incríveis paisagens e do mundo “perfeito” que se tem a sensação de experimentar aqui, a Suíça está em primeiro ou segundo lugar dos paises que tem maior índice de suicídio no mundo atualmente. Quem me passou essa informação foi minha amiga suiça, eu ainda não cheguei a verificar. Acho que se for falar disso, entraria em outros papos mais filosóficos. Mas só para dar uma rápida e superficial passada,... eu não posso deixar de me lembrar do nosso povo e em especial  do que vi do povo do nordeste, com uma vida tão dificil e aparentemente tão sofrida, com uma cultura tão alegre, tão rica e com povo tão sorridente e amável... quanto contraste, quanta contradição.... ou não?
O que faz os habitantes do “paraíso” tão infelizes?
Uma coisa é certa, de forma geral, percebo a falta do riso, da bagunça, do som, da descontração, do toque, do carinho. E isso não é só aqui, pelo menos dos países da Europa que conheci, é da mesma forma...
Aqui é aperto de mão... Tenho que me conter para não abraçar as pessoas. Mais do que tudo, e isso eu sempre sinto, mas não sei ao certo explicar... é algo sobre a nossa música. A nossa música tem um “quê”, que mais nenhuma outra tem e esse “quê” certamente está no nosso DNA... felizmente!  Enfim, papo para uma outra postagem, quem sabe outra hora...

Um comentário: